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quinta-feira, 31 de março de 2016

Memória de uma ameia*


 
Debrucei-me na nesga da fotografia e ouvi-te distintamente, o Rio encolheu-se na superfície e engelhou a curva arrepiando a margem e até as mãos pousadas na ameia vibraram, a voz distintamente repito, era tua sem engano, não interessa que música alegravas na garganta aberta, o que importa é que a esta distância toda eu te sentía como se a água fosse bocado de mim e se deitasse até à tua porta para encurtar as saudades do tempo em que os dois no pátio da tua casa apontávamos ao lado daqui e desafiávamos o Castelo na secularidade da sua imponência ante o diálogo guerreado e imparável de estórias erguidas de heróis defendidos na invenção de autor, a última palavra era a morte, braçadas pelo Rio a salvar bandeira e tu agarrado à tua a desgarrares solos de heavy metal numa versão surrealista.
Segurei a fotografia nos olhos e se pudesse teria chorado até afogar a curva do Rio.
 
 
 
* Castelo de Almourol, próximo da Vila onde meu irmão morou. Fotografia de Eduardo Jorge Silva

quarta-feira, 30 de março de 2016

Ainda lembro (quando chega a Primavera)


 
A meados do morninho chegava a toleima, uma coisa sem explicação que não era doença mas afectava, sem tempo certo mas certa de aparecer, flutuava até assentar e as ideias essas - na boca de gente grande - paryas, que não haveriam outras ou outras que se demonstrasse só aparentavam não ter miolo e como tal voavam, uma cabecinha de vento que se deixava ir soprada ao sabor do sol, da aragem, das vozes que transportavam a outras latitudes na continuação de historietas fabricadas no mundo da lua ou até noutros planetas inventados.
Com o crescer acrescentaram-lhe outras legendas, disseram-lhe da paixão, contaram-lhe do enamoramento e apontaram-lhe a culpa aos olhares virados às estórias da carochinha, corações palpitantes que desculparam pela loucura da juventude e o pouco tino ao discurso.
Mas as Primaveras repetidas e o esforço gigante da concentração não lhe esqueceram a fuga das nuvens e a correria dos campos verdes entre joaninhas vermelhas e ribeiros cristalinos. Abre o livro neste dia e faz de conta que lê, ninguém percebe onde está, só ela, parva e muito velha tem a página da infância de resguardo.

terça-feira, 29 de março de 2016

Não se ache


 
Tudo o que escrevinho vem da carne, é justo, sentido, dilacerado mas não se ache que o tempo do verbo fala de mim só porque o faço no eu. Eu sou a lâmina que me corta, sou a dor que grita, sou a cicatriz que espera os bordos unirem-se mas sigo sem feridas depois do tempo das palavras, seja homem ou mulher em cada pedaço de texto que apareço.
Recatos. Preciso. Porque a pele do verbo que é mesmo de mim quer-se privado, quiçá da escrita sem filtro no reflexo contemplativo do defeito, ruminado, escarafunchado até à vergonha do desinteresse.
E depois as verdades, o perigo da verdade da verdade e ainda a verdade da invenção ou a intenção do contar, o interesse da escrita, meio despida, meio vestida, a lógica do mistério e a insatisfação do termo, fim, confissões.
Mas não se ache menos homem ou mulher apenas porque separo dualidades, eu da que caminho, eu da que viajo escrevendo.
 
 

segunda-feira, 28 de março de 2016

O livro negro dos homens (vinte e dois)


 
Pequenas vidas estas que acham que mandam nas outras. Mas só se presumem ao comando porque na verdade ferem-se na angustiante dúvida de saberem ou não saberem que ordenaram, que disseram não, que contribuíram para a felicidade ou o episódico miserabilismo de quem fizeram alvo, uma incerteza com gosto rápido, quem disse que a vingança não era uma rua de dois sentidos?
Desgraçadas vidinhas estas que se empoam de nariz espetado, tão sozinhas no seu séquito de lambedores sem uso de língua que não seja a covardia da alfinetadela pelo esconso do tapete puxado, querem lá ver que do mando passa a pau mandado, ele há dias que são de todos e destes os do demo, na boca dos primeiros as injustiças pois então, que os sempre mandados serão os mais maus de todos.
Que regalo é sentir que mesmo sob a ordem nada de meu me é tirado porque toda eu sou minha.
De só nunca terei queixumes, outros em mim têm a força de me levar, de me pintar, de me escrever ou dançar, de me conhecer e saberem que no sorriso há o meu lugar, livre, um espaço onde nunca conseguirão alcançar porque apenas se presumem.
E quando apontam a dúvida pinga-lhes do dedo.


Lx., Abril- 2012

domingo, 27 de março de 2016

PaXcoa



 
PAZ.
Tempo de renascimento como o é na estação Primavera.
Não me animam outras vontades nestas linhas que não as do florescimento, não sou crente de fé alguma nem dada à oferta do pacotinho de amêndoas, gozo estes dias como puro interregno ao ritmo de trabalho mas peço PAZ, lembrar o ovo que significa o inicio da vida e o respeito que nos devemos a nós próprios como projecção do seu semelhante, PAZ como justiça ao nome que articulamos, PAZ pela mudança do homem na história, PAZ como evolução.
Que se honre o que somos por uma Páscoa intemporal.

sábado, 26 de março de 2016

Um traço [de tanto]



 
Foi a agitação dos pássaros e a sua indiferença ao fim de semana que me fizeram abrir os olhos, não de uma forma contrariada, permaneci na indolência do conforto morno e macio da cama a apreciar a chilreada, sons alegres que habitualmente não tenho condição de escutar, ainda lusco-fusco, as cortinas leves brejeiram-se à mudança do nascer do dia, daqui a nada ou daqui a muito, basta eu fechar os olhos de novo e adormecer, deixar-me ir enquanto posso na música que me oferecem, no silêncio agitado da vida das aves ocultas decerto muito coloridas pelo tom dos diálogos, tempos verbais a desrespeitar a frase rigorosa [comecei num passado e arrasto esta felicidade num traço contínuo e lento até ao presente, conto, canto, reproduzo o instante], sorrio no peito e admiro a placidez dos gatos incólumes ao desafio, o cão hibernado sem acusar os agudos, e sempre eles lá fora tão afinados nos seus afazeres quanto a dobra do lençol a delimitar preceitos inventados sabe-se lá por quem mas que estão certos e são-me precisos para me lembrar que não há dia marcado para se sentir alivio, oxigénio, um fiapo de simplicidade que pode parecer coisa nenhuma para todos mas para mim [talvez que me encha com pouco] foi tanto.

sexta-feira, 25 de março de 2016

Não ouço


 
 
Não há gaivota nem chão nem muro de cimento, quatro paredes civilizadas atiram-se a pino como abas de caixote pronto a ser fechado, a abertura é o céu que deixa caír para este pátio água ou vento ou restos de adivinhação de sons de vida para lá deste branco pintado.
Não ouço nada a não ser a cascata construída a preceito, medidas de rigor que arrastam uma torrente de vinte canais que despencam para uma taça que apara e bebe e volta a deixar caír numa cansativa barulheira que abafa tudo, não ouço nada e nem a mim, repito-me para me escutar mas uma surdez grita-me a plenos pulmões e até o cigarro me amarga a vontade.
Olho o céu no quadrado geométrico que a liberdade da vista ao alto me permite, sufoco-me nesta caixa de pensamentos que se calcam e os pés inquietos vão e vêm sem conseguir numerar passos ou ordenar frases ao ritmo da queda da água superiormente principal no cenário onde conto tanto quanto o vaso de flores esquecidas de regar.
Nem sei porquê, apresso-me.
Uma pausa que acaba por me oprimir, talvez do céu ou da água ou da falta da gaivota ou dos que ainda não chegaram aqui para comigo conversarem inalados no vício, todavia nem sei o que lhes dizer se não me ouço, repito, não os ouço.

quinta-feira, 24 de março de 2016

Ressaltos



 
Nos socalcos do regresso lavo as horas, os ressaltos da viagem à luz do dia deixam caír pedaços de tempo cansado. Abraço a minha bagagem entre mãos entrelaçadas para aquecer letras que não tive coragem de escrever, o caderno sacudido entre a estrada mal tratada e as chaves a pedirem a ranhura de entrada no sossego, até lá conto quantas casas já receberam outros cansados, luzes meio-acesas a confundirem o dia que ainda não se foi mas já não deixa ver a profundidade dos contornos.
Aprecio a beleza das fachadas dos prédios, os grafitis irónicos, as assinaturas repetidas a destruírem outros esguichos de tinta mal controlada no gozo do poder sobre a superfície, a decadência do abandono, cortinados que esvoaçam à espera de quem os afaste na esperança de quem os tome, pombos a morarem em casas de meia-luz, eu no ressalto da passagem ou do lado de dentro destas moradas a ver passar as horas e o infinito da viagem a apressar-me no desassossego.
Fecho os olhos, ironicamente às escuras tudo parece correr mais rápido.
Até sonhar que houve tempo para garatujar algumas palavras numa parede à minha espera.

quarta-feira, 23 de março de 2016

Campo de Palavras (28)


 
Palavras leva-as o vento diz o ditado popular, e ao invés do sentido pejorativo quisera que esquecidas fossem sopradas aos cantos do mundo para plantio, florescência e partilha de beleza e alimento de rigor, mas do vento todos sabem e ninguém o vê, das palavras vê-se muito mas pouco se atina.
O mal é que as palavras provêm da boca do homem e este é tão fiel quanto um dia de ventania, tanto juram a pés juntos como se lançam no salto para o abismo, tanto sopram despenteando como acariciam promessas em dias de Primavera.
Ele é ver campos cobertos de flores, lindas, e da raíz um cheiro fétido que mal se deita a mão para se colher o sentido murcha de tão fraca é a base que sustenta o argumento... Mas enfeitam durante um tempo, são agradáveis de olhar ao longe numa composição muito estudada. Vem o vento e arrasa tudo. Vem o vento e decora de outras cores palavras tão iguais às que se foram.

terça-feira, 22 de março de 2016

Je suis Bruxelles

 
 
 
 
Merci ANA, bonne fêtes de Pâques aussi . Le Portugal semble un peu à l’abri de toutes ces émeutes .Mais vous avez connu il n’y a pas si longtemps l’ouverture vers la démocratie perturbée.
Comment ne pas tirer les leçons de l’histoire, et être tolérant à notre époque ?
 
Bien amicalement
Monique TL 
France
 
 
 
 
Bonjour Monique,
 
J’espère que tu es bien.
La violence me perturbe.
Comme à Paris pour Hebdo pour le Novembre tragique mon cœur est avec ceux qui souffrent la perde.
 
Je te désire une Pâques tranquille
Bien amicalement
AnaC
 
 
 
Bonjour ANA,
Je lis ton message sur le blog , bravo de penser à nos amis belges .
Bien amicalement
 
Monique TREMIER LEJEUNE

segunda-feira, 21 de março de 2016

O telhado da noite


 
Anda comigo e deu a mão, não me deu tempo de recusar ou de pensar em desculpas delicadas mantendo-a a meu lado na companhia ou de dizer-lhe que esta noite é mais uma noite que não consigo dormir, a insónia visita-me ingrata e secamente sem conversas, planta-se ocupando espaço até se fartar e eu exausta de tanto desperta, ergo-me e vou.
Anda e na mão puxada, o braço esticado, levou-me até ao seu esconderijo ao alto trepado, perto da noite roçada na cabeça, o cabelo agitado pelo vento que de quando em vez aparece.
Sentamo-nos no telhado escorregadio a ver a cidade e o recorte do seu rosto na luz pouca surpreende-me tanto quanto o seu reaparecimento, o que me diz, o vestido branco e demasiado ousado na frescura e leveza do frio que sinto, a barriga ovalada que ampara e afaga, os silêncios que cortam o sentido das frases.
Teresa, digo o nome para mim, Teresa do Mar repito, mas parece que o som não lhe toca o reconhecimento do que é, segue apontando além o que não vejo, a outra mão dada a mim, sabes nem tudo é ido e nem tudo é de ficar, porque nem tudo é a vontade dos homens. Não percebo o que me diz, acho que me perco na beleza das palavras ou no momento em que trepámos para este telhado e o fascínio do perigo suspende o entendimento para ser digerido noutra hora, talvez numa em que a insónia se aproveite da minha fraqueza e a enxote ocupando-lhe o espaço com a beleza de Teresa.
Porque voltou não sei, desconheço se voltará outra vez mas as noites sem dormir têm custado menos.

domingo, 20 de março de 2016

Entre cantos



Ao canto, amontoado, e num relance que tive de repetir para confirmar que era porque achei que a vontade prega partidas e à força de tanto se querer e de tanta saudade, vê-se, dimensiona-se palpável o que não está.
No ângulo das duas paredes e ajeitado num tufo, um montinho de pêlo do Gaspar.
Segurei com tanto cuidado que deixei cair, receei que voasse e o perdesse da vista, agarrei-o na concha das mãos e fechei-as como um ovo.
 
Sobre a cómoda, o lenço branco de bolinhas negras esquecido do uso do dia anterior, engelhado entre a caixa de sândalo e uma ponta desmaiada.
 
Sentei-me na beira da cama.
 
Lembrei-me quando entrei em casa de meu Pai depois da sua partida e me marcou a imagem dos chinelos, o direito sobreposto na diagonal pisando o esquerdo, como largados na pressa para a troca pelos sapatos, achava ele que passada a hora do almoço regressaria, os pés de novo no conforto dos velhos chinelos, não voltou.
 
Abri as mãos e o tufo branco de pêlo aninhado na cova da pele arrancou-me um suspiro. Talvez dois. Talvez um grito que a contenção não me deixou ecoar nas paredes e vibrar tudo o que não consigo explicar, tudo o que me morreu, o que me foi. O lenço branco de bolinhas negras não me pareceu afinal, desarrumado. Apenas desesperadamente solitário como o pedacinho de pêlo achado do Gaspar, eu à espera de regressar. 

sábado, 19 de março de 2016

[A]guarda


 
Paciente ou nem tanto, espero. A mando, por vontade própria, por imposição de outros, das circunstâncias, da natureza, do tempo e dos tempos, fico à espera. Desde sempre. Encosto o ombro para suportar esse espaço sem medida, esse bocado de nada em que aparentemente o vazio acontece nada sucedendo e detenho a vida suspensa até despertar para o movimento em que deixo de aguardar.
Aguardo pelas palavras que não consigo dizer, que desenhadas realizam a fala da espera aguardada, retardada, um azul-china que não sai, encostado ao branco da página exibindo ombros vincados na presença incómoda de ainda ali se encontrarem mesmo depois de já não estar em guarda, defesa, preparada no discurso de quem espera. [A]guardo os meus tempos de vida, tempos de [outras] vidas na companhia paciente, impaciente, de quem se quer, de quem se despede, uma espera contínua como um fio suspenso e invisível que prende o seguinte e outro e os demais, a mando, por imposição, por naturezas desconhecidas que colam vidas a bocados de esperas e unem vazios aparentes como se nada sucedesse até ao movimento seguinte de [a]guardar outros.

sexta-feira, 18 de março de 2016

Parece mas não estou



 
Num ápice parece véspera e desse arrecuo maldigo a Quinta que abomino, duplamente a sensação de a reviver num dia que não quero em espiral que não me cospe ou não saberei qual a porta de saída, dia de boi outra vez, bato o pé na reminiscência de palcos em almas penadas onde a minha, decerto, por lá anda em encontrões, batidelas de pé na convicção de que tudo sai melhor quando o cumprimento das pequenas superstições de palavreado viril e sapatilhas velhas sabem o ensinado e assim sendo, o tempo salta, de Quinta voa-se para Sábado que esta Sexta não há meio de me despegar.
Que inquietação.
O relógio no pulso nem calha a jeito de compasso da pulsação, acelero-me, desacelero os minutos dos olhos e o pé na batida marca outros ritmos cacofónicos que me atrasam a entrada. Ou a saída. O tempo não passa, o tempo passa devagar, como corre o tempo que não o seguro ao dia que dizem ser bom de fim, bato o pé, dia do boi foi ontem, hoje largo-me em avenidas de alfazema que não têm cercanias, porque de verdade nem sequer cheguei a estar.

quinta-feira, 17 de março de 2016

O céu da boca (Palavras Reencontradas) 14



 
[...]
 
Pára.
E eu paro. Um sinal de stop que me trava a fundo, cansada, exausta, não pela mão sacudida da dormência do gesto de segurar a caneta, há calo, aperto o pulso, fecho e abro a mão e se for preciso passo para a esquerda, paro porque a verdade das palavras sempre me impôs a transparência dos sentidos e da transmissão que isso me custava, quantas peles a despir, quantos eus, tanto de mim sem falar de mim, sem haver diários ou o resvalar de uma piedosa confissão de dores na lágrima a pedir outras em comunhão até - drama! - se chegar a um ranço detestável de novela.
Pára e eu parei de gostar.
O céu da boca acinzentou-se em palavras que me sabíam às de sempre, um cozinhado sem apelo de novidade ou sal demasiado a disfarçar ingredientes pobres ou no extremo, a ausência de tempero que desse  a volta ao verbo. A língua parecia-me morta, eu cansada das letras por me ter enfartado na comilança delas, um enjoo em que nada me parecia apetecível por tudo me saír plastificado.
No estático da caneta descobri a sombra que a caneta fazia sobre o branco das páginas, a beleza de reencontrar dizeres na forma mais simples e mais despida de tudo.
Sim para querer.
Não para afastar.
Amor para escrever.
 
 
[...]
 
 
(in O céu da boca (Palavras Reencontradas), Setembro 2014)

quarta-feira, 16 de março de 2016

Como é que hei-de dizer...

 
 
 
Eu de Alberto na ponta da trela, bem comportado, acata-me os olhares sem necessidade da fala [nem eu falo canês nem ele humanês, os dois entendemo-nos perfeito], a vizinha do prédio do fim da rua [com quem viajei anos nos transportes públicos sem trocarmos uma palavra até ela adoptar uma cadela] a assistir à Justina, uma bulldog francesa de 9 meses, a pastar nos canteiros.
Eles, os de quatro patas, cumprimentam-se e despacham a coisa.
Nós, de apenas duas e sem trela, enleamos a conversa.
Quem somos, de onde viemos e o que fazemos. O que gostamos de fazer. Para além de amar o Alberto e a Justina. Rimos. O dia está bonito e ficou mais bonito. Nós aqui tão perto e nós sem sabermos. Falamos de como nos víamos nos anos que nos víamos sem nos vermos e sem nos falarmos, mas a ver-nos.
Falamos de livros, de ler, de escrever, de consumir letras como necessidade de ar para viver.
Diz-me do gosto das páginas e do papel, do peso do livro das mãos, digo-lhe das mulheres e dos homens que povoam o mundo dos meus cadernos [talvez tenha sido um raio de sol que lhe enrugou a testa]
Alberto, contrariado de tanto sossego deu um esticão. Justina empanturrou-se com uma folha seca de palmeira.
A vizinha tocou no peito com os dedos ao de leve e disse o seu nome.
Eu disse o meu. [Mas senti-os nas minhas espáduas pendurados, tossicando, fazendo-se de importantes...]

terça-feira, 15 de março de 2016

Sem travessão

 
- Então? Instalada? Gosta de cá? É melhor?
Não tenho tempo de inalar para fazer travessão e em discurso directo responder às perguntas por isso restam os atributos de uma narrativa de lado, em pé por respeito porque fui a última a chegar num bando ruidoso e talvez seja a forma de me desculpar, muda pois também não fica quem me inquire o tempo suficiente para receber o valor da resposta.
Segue.
Repete.
- Então? Instalado? Gosta de cá? É melhor?
À terceira já decorei e tenho tempo se houver oportunidade que se faça o caminho inverso de oferecer as respostas em directo. Com direito a travessão. Até lá, abro os olhos muito muito como faría um lemur para não perder pitada das palavras, pode ser que hajam novas, pode ser que haja um tropeço, pode ser que alguém interrompa e tenha aprendido antes de mim e lhe responda no travessão atravessado na goela.
- Então? A passear? Gosta de nos ver por cá? É pior para si com tanto barulho?
Antes mesmo da surpresa do engasgo hei-de abrir os olhos, mais ainda do que antes, não pela demanda do novo interlocutor mas pelo silêncio que há-de rachar os segundos, o sorriso por dentro, inspirar-expirar, regresso ao discurso indirecto da realidade.
Ouço.
- Benvindos!
De lado não tenho hipótese para o agradecimento, tão pouco há volta de retrocesso, é um caminho de ferradura, pisco os olhos, novo visitante, as mesmas perguntas.
Ainda bem que não sou a primeira da fila.
 
 

segunda-feira, 14 de março de 2016

Travessias do Rio - 8



Tal como eu aqui sentada e composta sem ninguém desconfiar, que aparentemente estarei tão anestesiada quantos os demais fregueses, também alguém mas numa das duas margens estará composto e aguardando sem que ninguém desconfie, olhará dentro do cacilheiro, eu num desses lados, o Rio de permeio como régua de medida do caminho que tomamos até nos encontrar.
Um dia.
Um dia pode ser que os nossos olhos se achem, os dele toquem nos meus, aqui sentadinha e bem direita, sem nada dar a entender a quem segue a meu lado de todo este mundo que enche este pequeno barco de viagens atafulhado de muitas mais gentes que possam ver e governar, com recados de quem espera numa margem, sentado, aprumado e vigiando o rumo na vontade do Tejo, deixando pensar que é Mestre quem vai ao leme.

Um submarino negro ao lado do cacilheiro levanta os passageiros que acorrem todos para o mesmo lado.
Tal como eu um rapaz à esquerda entorta o tronco, agarramos as nossas cadeiras onde estamos sentados, o barco adernou, olhamo-nos por segundos nesta perspectiva.
O Rio engole o monstro e ninguém desconfia.
 
 
in Travessias do Rio, Março 2016

domingo, 13 de março de 2016

A pasta castanha


 
Não adianta fingir que ainda há noite para ser dormida, clarões em disparos vão e vêm como alarmes a impulsionar a vontade de erguer, ir, descobrir. Não me lembro se me lembro, por isso a pasta castanha tão bojuda como uma mulher prenhe deixa-me desconfiada e ansiosa pela falta de memória do seu recheio, aguada pelas mesmas razões.
Esventro o que é meu como se de outros segredos olhasse e nas páginas de muitos anos regresso a caminhos inversos: Descubro, vou, ergo-me. Há bréu em dias plenos com traçados perfeitos de nocturno em que a fisionomia dos que aí vivem se destaca da minha, porque eles são eles e eu sou visita das vielas deles, não nos mesclamos na simbiose de uma confusão de personagens em que tomo dores alheias ou deles se acha mão para me arrastar até vicio de esquina e por lá me perder.
Sem fingimentos, tudo na pasta castanha é violento, inchado, não que o seja pela crueldade mas pela crueza do sentir, do palpitar. Talvez por isso muito do verbo tenha aí ficado preso pela toxicidade da memória...
E no meio, algumas cartas. Muito belas, demasiado simples no seu dizer de saudades. Do Pai para a Mãe.
Clarões.

sábado, 12 de março de 2016

Das portas & janelas - Vol.2 - Esboço nº4



 
Rio-me, sinceramente que me rio, tive que olhar duas vezes para corrigir o engano dos sentidos e emendar o sentido dos pés, adiante vários passos e de arrecua outros tantos até estarrecido ofender-me de pescoço esticado para o despautério da paisagem e estar certo que não havia erro, pudera! Conheço melhor estas janelas que as de minha própria morada - pois se nem uma tem! -  ou não tivesse eu plantado a minha figura por aqui anos a fio, porfiado, rezado, noites de relento na esperança de um sinal e abertas só uma nesga, coisa pouca que duas mãos da criada de fora pudessem enxotar, que Sua Senhoria não estava ou Sua Senhoria não gostava de pedintes à porta ou Sua Senhoria estava indisposta ou até aquele dia em que mandaram eu subir que o Pai de Sua Senhoria iria receber-me.
Por isso me rio, de raiva pois então! Quem é esta gentinha que aqui se instalou que desfeia as janelas do meu penar, reduzindo a estendal de panos velhos, o palanque do meu amor declarado? Como ousam escancarar janelas largando aos que passam, os sons guardados da memória que a minha paixão cantou entre quatro paredes?
Rio-me de lágrimas de vingança, rio-me no esgar do regresso amargo do desencontro, só, Senhor de mim a sua casa voltado onde fecharei janelas se entenderem abri-las, onde gritarei por Sua Senhoria quando se acharem no mundo de Morpheu, rio do tempo em que fui homem e o medo me autorizava.
Aqui ficarei à espera do meu amor, nem que demore outros duzentos anos. 
 
 
(in Das portas & janelas-Vol.2, Junho-2015)

 
Todas as fotografias da Colecção Das portas & janelas-Vol.2 são da autoria de Eduardo Jorge Silva

sexta-feira, 11 de março de 2016

Não mais até amanhã


 
Queimo os últimos cigarros aqui neste cinzento de penas obrigado, que é como quem diz os últimos cartuchos, a última visão do alto que tanta vez me mirou do Rio, do meu lado esquecida, da raiva a fugir em degraus galgados no tropeço de pés e mão a ajeitar o tombo mais rápido que o elevador civilizado, das lágrimas ainda nesse tempo sabiamente choradas pela dor, doutras lágrimas pedidas sem fio se sentirem a molhar para amostra, de divertidas contagens de minutos no gargarejo da gaivota e de outras metidas à conversa e ainda de nada, simplesmente ao vento, ao passar das estações até lhes perder o sentido e me acimentar no chão como se a carne lhe pertencesse.
 
De hoje não volto.
Não direi até amanhã, se a gaivota quiser que venha visitar-me ao novo sitio, daqui as falas enterram-se como os joelhos batidos no muro em cegas caminhadas para sabidos como final de trajecto, de hoje para trás esqueço-me de presenças a este lugar e até das ausências voadas para me esquecer que estava cá e que nesses instantes as linhas de palavras imaginadas a que me agarrei penduraram-me para fora, libertaram-me.
 
Lanço os olhos ao azul violento do dia e apago o cigarro.
Não sinto nada, nem palavras para me fazerem escadas de descer, nem memórias de ficar.
A gaivota pousa no tejadilho do carro arranhando a pintura metalizada e pela primeira vez nada nos falamos. Pia como ave que é e eu parto como tem de ser.
 
 

quinta-feira, 10 de março de 2016

Estórias da noite


 
Nesse tempo eu fazia redações e tu ensaiavas a mão nos primeiros desenhos de letras, os dois tínhamos uma imaginação sem medida mas quando a noite nos tapava e a Mãe dizia silêncio para dormirmos, logo tu vinhas com o pedido da estória. Eu gostava. Inventava. Tudo o que saía baixinho depois do era uma vez há muito, muito tempo era do correr livre e sem contenção das palavras que se formavam na minha boca como páginas que ías virando à medida da progressão da narrativa. Nunca havia fim ou pelo menos tu nunca estavas acordado para ouvir a exultação do herói ou a entrega deste no drama da sua vida pela humanidade, o sono chegava-te tranquilo e a mim deixava-me a pensar nessa gente que aparecia na minha cabeça tão repentinamente mas tão nítida como se os pudesse ver. Pela madrugada, os pesadelos vinham com os monstros sacudirem-te, a Mãe a proibir as estórias da noite enquanto te abraçava e eu estremunhada e culpada de um crime sem prova, não me lembrava mais do que havia inventado.
 
 

quarta-feira, 9 de março de 2016

[Corpo de]Medo



Sento-me na cama, protejo-me na roupa desalinhada como muralhas defensivas que me possam tornar cousa invisível, intocável, desaparecida. ausente deste medo que me caiu num repente pela cabeça e me molha transpirada num fio que me aperta o pescoço aflita, um medo que não é meu e lembrado das infâncias sufoca desesperado à luz pálida do candeeiro pequeno.
Olho e não vejo, olho e vejo o pesadelo vermelho que ainda me segura a carne dos braços vincando dedos gretados a pedir ajuda, só quero escapar, trepam à minha cama corpos escapados dos horrores do sonho e desses corpos gritando-lhes sem som ajuda de não me tocarem pelo nojo eu suja dos sangues deles, dos bocados agarrados deles nas minhas mãos que empurrados os trazem comigo.
Sento-me na cama, o medo deitado ao meu lado. A luz pálida do candeeiro fala aos poucos dos contornos de tudo o que escolhi mas desconfio do que não vejo e do que me pode espreitar. 
Sem sossego pelo ciciado que me sopra junto à nuca o medo deita-me e aconchega-me a roupa.
Tenho frio, um gelo de escuro de luz apagada, deixei o meu sangue aos corpos do meu pesadelo.

terça-feira, 8 de março de 2016

Preciso de ti


 
 
Estendeu-lhe os braços adiante caminhando e assim se manteve até a distância se acabar e os olhos próximos tocaram-se na cor como a ponta dos dedos sabiam o lugar para as mãos e se apertaram até aos pulsos para se puxarem com força atraída de íman.
Abraço.
Aconchego parado.
Os braços a puxarem a si o corpo que não é seu querendo fazer sua a batida do coração, as palmas abertas nas costas a acariciarem devagar como leques em Primavera e o rosto de lado repousando no ombro conhecido que não é seu em encaixes de saudade, uma sede bebida a goles lentos e fartos que encharcam até marejarem os olhos de semelhança.
Estendeu-lhe as mãos e assim se mantiveram no silêncio do sorriso.
Depois a seriedade sucedeu. Não houve beijos ou outros planos cinematográficos que virassem a cabeça de quem passava ou palavras de aspereza para comentário alheio, tão pouco gargalhadas sonoras que a outros despertasse o riso contagiante.
Seguiram a par, a esquerda ligada à mão direita, sabendo que estavam um para o outro.
 
Pousou o lápis, a mão dorida do esboço, fechou o caderno, estava feliz com a manhã de trabalho.
Amanhã haveria de colorir a aguarela.
 
 
 
 (in Telas, 2009)

segunda-feira, 7 de março de 2016

Diferente, sempre diferente


 
Gosto de chuva, não é segredo, já foi e há-de continuar a ser palavra gasta aqui na Árvore.
Nem sequer vou voltar às razões do meu gosto, gostar é argumento de per si bastante para não ter discussão.
Mas o que inquieta (mais os outros, nem  tanto a mim) é este favoritismo pela água vindo do topo, como se isso fosse coisa do gosto de gente com dois dedos de testa, que ele há gente para tudo bem entendido! mas querer-se chuva?! se quer alguma coisa que se queira sol, pois então! mas não, eu sou do contra, só o digo ( não por gosto, dizem eles que acham piamente que eu não sei o que quero) para contrariar.
Pergunto-me que raio de comichão faz a esta gente se eu ando à chuva e eles amontoados no resguardo, não param de agitar os braços em curva no chamamento do sai daí, anda prá'qui, tá a chover (eu estou a ver que está a chover, não acham?), e acompanham a desolada nega com comentários sobre teimosia, anormalidade. (Anormalidade??)
Mais um bocado e hei-de ouvi-los a dissertarem sobre tolerância. Compreensão. Não a propósito de mim, entenda-se.
Mas (já) não digo nada.
Tenho a alma lavada. (E não estou para me standardizar)

domingo, 6 de março de 2016

As que não estão no caderno


 
Sempre me parece melhor o que não escrevo, o que entre fronhas, cabelos soltos e monólogos desliza ágil de palavras mudas que vejo desenhadas e perfeitas, muitas vezes faladas por belíssimas vozes que se impõem à minha mão no comando como ditados que cumpro lesta sem arestas de engano na comida de letras ou afasias à pontuação, certa, respirada, tudo vivido em tempos magníficos mesmo quando a dor forra as paredes do cenário e quem fala diz pouco contando tanto no verbo bastante para se entender, eu assistente, eu adereço sem valor, eu vou virando as páginas à medida que cheias pedem novas e afinal nada escrevo.
Tenho-me cansada de quilómetros de linhas, recordo frases e a união das folhas é impossível de reconstituir, há todavia o gozo de as ter feito. Onde -  talvez um dia as ache.
 
 

sábado, 5 de março de 2016

Instantâneo - Episódio quinze



Um trago, não me vejo reflectida nesta beberagem de fingir, uma cópia rápida e granulada dos originais apurados que desde a plantação à degustação não tem maneira de se lhes traçar uma linha que compare meios e sabor e logo eu que abomino imitações, ainda engulo a mistela admirada do descontentamento que as páginas em branco açoitam no tempo a passar, ingrato e demorado, uma lágrima de tinta no bico da caneta sem pingar nem enxugar-se económica no desperdício, um trago e  nem a imagem de mim na desolação do recorte dos olhos, nariz, o beiço a chuchar a loiça, meia-testa se vê devolvida neste clone instantâneo e bizarramente nomeado de café. Todo o resto é verdadeiro, demasiado real para ignorar o arrefecimento das palavras, trémulas, friorentas nas mãos e nos pés que esfrego à procura de um ressuscitar que me incline sobre as folhas, sobre os passos que estando guardados nunca se esquecem, um trago que me imprima para o papel. Mas tudo o que faço são rascunhos, atamancados de uma idéia, coisas que chegam e se bebem sem tomar sabor, imitações do escrever numa hora perdida.

sexta-feira, 4 de março de 2016

Manhã (só mais 5m)



Cinco minutos de uma eternidade, cinco minutos onde os algarismos não têm memória porque se fazem eternos na profundidade de um mergulho onde se deixa tudo, corpo e ser, e deixando esse todo e não se sabendo quem mesmo assim não se quer o regresso, cinco minutos do mais saboroso porque do mais perdido ou do mais esquecido do que se é, corpo e ser, ou nunca ter sido ou ser o desejo em absoluto, realizado, palpável em cinco minutos de eternidade que não se sabem que são mensuráveis em cinco ou toda a vida, apenas um mergulho de felicidade profunda.
Confusa felicidade que tritura os algarismos ao emergir no espasmo da vida, vidas reencontradas no corpo, o ser ao corpo, colisão da realidade.
Os dedos no despertador esmagam os cinco minutos extra, ergue-se, a dose injectada foi esquecida.

quinta-feira, 3 de março de 2016

A elegância do paquiderme (ou a continuação da besta do texto anterior)


 
O zunido que sinto não sei onde tem origem: Se dos tímpanos pela vibração irritada do martelo aos decibéis, se dos dentes pela força das mandíbulas em manter as palavras apertadas para não se escaparem, se dos punhos pela vontade de não abrir as mãos e ensaiá-las num bom par de estalos, se do estômago por já não conseguir mais volume para engolir tanta estupidez.
Tento não perder a postura, mas a saliva a mais que engulo e engulo vitrifica-me os olhos e a falsidade do que não sou cai em pedaços minúsculos que pisam ao passar, descuidados, desafinados, muito surdos do ruído conjunto.
Os meus olhos pisados reduzidos a pó.
Não sei de onde vem o zunido, talvez que venha do vidro cantado, dos restos dos meus olhos cantados em bocados perdidos e chutados para uma pá no final do expediente por uma laboriosa funcionária de limpeza.
Mesma cega há que não perder a elegância e nestes casos, devo cumprir o que se espera: engolir a saliva a mais sem me babar como um animal.
 
 
Nota* A atracção da foto é a eminente e delicada pata do elefante desviar-se sobre a vamp em pose 

quarta-feira, 2 de março de 2016

Travessias do Rio - 7



Em tantos anos nunca atravessei o Rio com o Gaspar, não de patas a marcar molhado a quatro bolinhas como tatuagens pelo chão, só no peito, no cheiro, nos pêlos cuidadosamente puxados do casaco e libertos pelo peso do ar a fugir pelo invisível dum sitio perdido, na lembrança de se estaria a dormir àquela hora.
Talvez se este bocado de água se tivesse feito estrada dura o tivesse trazido, os dois a par de nariz a adivinhar o liquido disfarçado com as gaivotas ao alto a rirem do engano mal contado, o cacilheiro de enfeite, os marinheiros de olhos azuis como faróis na margem segura.
 
Talvez hoje seja o dia de ser cão, eu cão ou outra besta de quatro atravessando o Tejo como só um animal o sabe e pode fazer sem males ao Rio e ao céu e sem se importar com nada mais que o alcance das patas.
 
 
in Travessias do Rio, Fevereiro 2016

terça-feira, 1 de março de 2016

O jogo da forca


 
Hoje não estou para amar, vinco o caderno nas sílabas dos advérbios sin-co-pa-da-mente e o empregado repete o meu pedido sin-co-pa-da-mente atirando com dois pacotinhos de açúcar junto ao copo de sumo de laranja, o café duplo, um instante de espera olhando a fúria da escrita a embaraçar as folhas do caderno.
 
 
Devía propor-te o jogo da forca, uma letra, uma palavra e ía construindo a armadilha com as tuas próprias frases muito a propósito, provavelmente as que não disseste, as que num cenário perfeito como este teriam caído tão bem e eu na ilusão de um texto à medida tería escutado o que mimicamente os teus lábios teriam articulado, pena o ruído das chávenas e das pequenas colheres a adoçarem-se em copos de sumo de laranja com dois pacotes por abrir.
 
 
Fecho o caderno depois de te pendurar pelo pescoço, a boca aberta, nem um pio.
 
 
(in Eu na Versailles, escritos improváveis, C.G.-Novembro/2005)