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domingo, 25 de novembro de 2018

À espera da árvore



Vou dizendo para mim que quando chegar o dia de estar junto à árvore vou ter tempo para contar tudo, uma jornada tamanha há-de fazer-se palavras e nesse dia, o tempo será a medida do meu contar, os séculos da viagem serão folhas a encher para um abrigo da memória, uma copa larga que me acolherá. Talvez feche os olhos no esforço de lembrar tudo, ou mantenha fixo num horizonte a lamber feridas que não saram. E conto.

Por agora, vou dizendo que não tenho tempo, engano-me no adiar das visitas, porque de tanto ter para dizer não o digo. As palavras vão-se murmurando em silêncios, faço ponto final onde não devia terminar, tento esquecer para o dia em que diga que vou ter tempo, e o receio desse momento a aproximar-se paraliza-me a mão, o saber contar, hesito memórias. Para quando chegar o tempo de contar.

Digo-me que quando chegar o tempo talvez não haja tempo de contar tudo.
As folhas serão de Outono, amarelentas e queimadas, um sopro de vento a esconder palavras ou a fazer chão pisado, eu mesma a desconhecer o que plantei sento-me, cansada da viagem e deixo a árvore apenas ser uma árvore.



sexta-feira, 13 de julho de 2018

(Ainda sem ) Paz





deixei de falar sobre estórias, livros, palavras que falam de palavras mágicas, bailarinas, coisa de palco, lançar os olhos no brilho do que não vejo vendo apontando no bico do sapato ou na ponta da caneta, deixei secar a tinta permanente na última carga e não gastei um cêntimo mais a comprar outras, sento-me no lado do cimento dos prédios e deixo o rio ser água, sem cor, sem manto, sem estrada, levo-me e regresso sem suspiro e sem lembrança, apago luzes que teimam de quando em vez fundirem páginas de clarões onde corro a azul e letras maíusculas se encavalitam falando de generosidade, liberdade, uma invenção que desconheço, não sei que dizer, não percebo o que dizem, não comento sentimentalidades que possam trair a voz ou devolverem perguntas sobre o que sinto ou sei, ou tenha sido ou perigosamente, tenha sentido ou até feito, não fiz nada e do sentir deixei-me, nem para estórias acordo, caio para dentro de mim e não sei porque não acho, porque não sei o que procuro.




quinta-feira, 12 de julho de 2018

Não é novo. É respirado.

Não me fui.
Não desapareci por doença ou falta de apetite à letra, de novo o tempo à esquina à minha espera para conversa pelos cotovelos, deu-me largueza para o lamento, para a lamúria, para as noites em que o queixo afundado abafou na fofura dos tecidos as vozes pertubadoras, calaram-se, fiquei sózinha, tão sózinha que as memórias de miados, latidos, chamados e nomes pequenos secretos se fizeram em companhia.
De novo a multidão.
A sórdida lembrança de coisas que se querem esquecer à força para não doer e se pedem para nunca esquecer, o comentário enrolado das palavras desenhadas na pressa num canto qualquer de papel, lábios apertados de boca cheia de velhos sentires, novos sentires, eu uma outra de casca rugosa, mas tanta fenda.
Dou por mim aqui, sem tempo. Foi-se-me. Que talvez nas noites de rolar para lá e para cá, à espera de um silêncio ou de ruídos conhecidos [seriam uns ou outros?] a esquina fosse uma metade que eu não quisesse escutar mais. Doia de mais escrever.
De novo a multidão.

Há quem regresse, respiro e estendo a palma apanhando a mão na direção da minha, outros não voltarão. Doeu não escrever.