Nos socalcos do regresso lavo as horas, os ressaltos da viagem à luz do dia deixam caír pedaços de tempo cansado. Abraço a minha bagagem entre mãos entrelaçadas para aquecer letras que não tive coragem de escrever, o caderno sacudido entre a estrada mal tratada e as chaves a pedirem a ranhura de entrada no sossego, até lá conto quantas casas já receberam outros cansados, luzes meio-acesas a confundirem o dia que ainda não se foi mas já não deixa ver a profundidade dos contornos.
Aprecio a beleza das fachadas dos prédios, os grafitis irónicos, as assinaturas repetidas a destruírem outros esguichos de tinta mal controlada no gozo do poder sobre a superfície, a decadência do abandono, cortinados que esvoaçam à espera de quem os afaste na esperança de quem os tome, pombos a morarem em casas de meia-luz, eu no ressalto da passagem ou do lado de dentro destas moradas a ver passar as horas e o infinito da viagem a apressar-me no desassossego.
Fecho os olhos, ironicamente às escuras tudo parece correr mais rápido.
Até sonhar que houve tempo para garatujar algumas palavras numa parede à minha espera.
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