Agora tenho frio. Muito. Sopro na concha das mãos, amornando um nevoeiro branco, denso, que envolve a cidade e disfarça as árvores galhudas em edificios fantasmas, os faróis dos carros em enfeites de pré-natal.
Agora farejo um fumo cinza, mascarrado de castanha assada, o pregão do amolador mais o do vendedor piam escondidos nas abertas de água gelada que impiedosamente tomba sobre quem corre à procura de refúgio.
Agora, em peúgas de grossa lã consolo nas vidraças riscadas a chuva do lado de lá, as papas de aveia misturadas na casca do limão, que este amarelo lembra o sol, a canela traz-me o sonho de outras latitudes e o dedo que guia estas estradas escorregadias desenhadas no negrume do céu, imita vagas e adamastores.
Agora embrulho tudo na minha memória e sou pequenina outra vez.
Para onde foram o frio, a chuva, o aconchego de casa, o colo da mãe?Basta apenas fechar os olhos e tão perto como nunca sinto a aspereza da fazenda molhada, o morno do banho quente, os vapores de eucalipto, as mezinhas de bem-fazer...e quanto mais o tempo avança e eu me distancio de farrapos de lembrar, mais perto fica a saudade e mais sonho com a minha infância.
(C.G., Novembro 2005)