Há medos que não tenho. Aliás tenho medo de ter medo. Já houve um tempo em que tive medo do que não vía e imaginava. E passava a ser: eu dava-lhe forma, textura, movimentos. E criava-se no meu medo. Até lhe dava voz e alguns tinham nome. Mais à frente já era eu que os chamava, apoquentava-me não os saber. Mas não voltavam. Quando descobri que eu é que tinha essse poder e controle sobre eles uma estranha melancolia tomou-me, quase me desencantei e tive várias revelações a outros níveis. A magia do desconhecido esvanecía-se, aos poucos adensava-se outra névoa muito mais próxima do mundo real e dos homens. Mas também de outros que se descolaram de mim mesma numa insatisfação de sobreviverem sob o meu perfil e carácter, exigíam independência. Aquela sensação de saliva a mais e um arrepio no estomâgo ou na barriga ou nas costas regressou, agora completamente nomeada pelos sons das palavras, nada de tapar os olhos ou engolir o grito no disparo do coração. Lembrei-me dos medos mas isto é coisa diferente. Compliquei-me. Dantes era mais fácil, nem precisava de justificação e de lá até aqui encontro-me. No ser. Medo de não ser.
Nota: A imagem é de um tronco. Com muitos nós. Como muitos de nós, desdobrados como uma folha em que entornámos tinta e apertámos para o decalque da imagem na outra metade. Faz medo, não é?
Um beijo aos que sabem do que falo.
11 comentários:
Só para que saibas, por que para mim é importante: passo muitas vezes por cá, no difícil da noite, silencioso. Por estes trilhos diferentes, de pedrinhas que é bom sentir debaixo dos meus pés e ervas que quando for dia serão verdes. Mas, a estas horas, somente pressentidas sob a luz de luares sem lua. e riscos de pirilampos.
Com a ponta dos dedos deixo no teu rosto, desejando uma amiga, suave e também imperceptíval inclinação de aceitação,um imperceptível beijo.
(isto saiu bem piroso, hem !)
esquece a pirosice e aceita a parte boa. Se houver.
E obrigado pelo que me dás.
Gasolina
O medo existe, pelo menos perante uma dessa carrancas, toda a gente sabe o que é o medo. Porém esse não tem côr e nunca o senti verdadeiramente.
Há que sermos forte quanto ao sentimento do do medo, enfrentando-o destemidamente. Valerá a pena, pelo menos pode ser deduzido do teu belo texto.
Daniel
os medos que tive transformei-os em histórias.
entendo-te. sempre.
na minha língua sei do que falas
mas a pronúncia será a mesma?
falaremos o mesmo dialeto de medos e segredos?
não há um decalque igual
um só que seja, em milhões que façamos
um beijo
luísa
Gasolina
Ver a carranca pode indiciar medo, mas o texto bem escrito, cmo calculava não me inspirou esse sentimento. Posso saber do que falas, mas as minhas experiências nesse sentido, são de molde a continuar a ter cuidados para ter medo.
Daniel
Medo de ter medo. Medo de ter medo. Quantas vezes?
beijo
Daniel,
Em garota vivi numa casa em Coimbra com um corredor com sete mts de comprido. Atravessá-lo às escuras era uma prova de fogo. No dia em que o consegui fazer sem ser de olhos fechados ou a correr senti-me a pessoa mais valente do mundo. E depois já era eu que me desafiava a mim mesma chamando os medos.
Agora não acho medo em nada e quanto muito, receio muito mais o que vejo do que o que não é palpável.
Mas acho que isso é crescer, não é?
Um beijo Daniel
Laura,
Compreendo-te.
Alguns dos meus estão por aqui, em palavras.
Mas outros há que por terem deixado de me assustar, os guardo na minha intimidade, passaram a ser segredos.
Um beijo imenso
Pin,
Pois não há decalques iguais!
Que aborrecido sería se todos fossemos semelhantes e reagissemos da mesma maneira.
Mesmo sendo as pronúncias diferentes de uma única lingua.
beijo para ti L.
Daniel,
Tu tens um bónus que eu (ainda) não tenho: Vivência.
Sabes encarar as situações pela tua experiência de vida de uma forma diferente da minha, tens cuidados que eu por agora desconheço.
E no fundo, a carranca é apenas um exemplo de que aquilo que um dia nos assustou mais tarde poderemos vir a achar belo.
Um beijo grande para ti
CNS,
Tantas quantas as palavras, não é?
Beijo
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