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terça-feira, 29 de julho de 2008

Acabou



Puxou a noite para as costas, acomodou-se, estava bem, as mãos preparadas, dentro de breves segundos escrevería adeus, não sería só um acto mental, um ganhar coragem para a atitude, sería mesmo em definitivo. Já tinha pensado que se não o fizesse assim de nenhuma outra forma o faría, era igual como quando fazía as contas da semana e constatava o dinheiro que lhe sobrava para o essencial, os legumes, o pão, o leite, nada de extras apenas o nutritivo e vital.

Pôs a data no topo à esquerda, linha abaixo o adjectivo, mas não lhe quería chamar querido pois já não o era, como podería? um preguiçoso isso sim, um cansaço contínuo em trabalhar, em fazer por, em dar-se, em ter vontade para, dizía-se diferente, doente por dentro, incompreendido numa luta abstracta a quem de um certo filósofo aprendera existencial.

Escreveu o nome dele, simplesmente.
E foi como abrir uma comporta, saíu tudo, alinhado e revoltoso, consciente e despegado daquela pele que se teme seja tocada de novo e reviva os momentos de riso e beijos e faça retroceder a decisão que se jurara não voltar atrás.

Dobrou a carta, pegou no envelope mas parou. Não merecía tamanho desvelo em guardá-la protegida, entregá-la-ía na mão dele. Desdobrou-a e releu-a, ouviu distintamente dentro do seu peito a sua própria voz a olhá-lo nos olhos e a dizer-lhe todas aquelas palavras.

Depois sorriu. Rasgou o papel em muitos pedaços e estes em bocadinhos ainda mais pequenos.
Bebeu um copo de água.
Ele bateu à porta como quando lhe apetecía aparecer. Ela abriu, olhou-o, repetiu o sorriso e fechou de novo a porta.

2 comentários:

Eternos Sentidos disse...

Gasolina
Quando algo acaba, muito há-de iniciar-se. Basta lembrarmo-nos das mudanças da arvore ao longo das estações do ano. Basta lembrarmo-nos na evolução do belo que essas mudanças lhe dão.

Beijo de um admirador acérrimo das tuas palavras, da tua arvore e dos teus frutos.

Gasolina disse...

Eternos sentidos,

Claro que sim!
Porque pensas que a mulher sorriu ao fechar a porta?!
Tudo é um recomeço e ficar preso ao passado apenas arrasta correntes que atrasam a vista mais além.

Obrigado pelas tuas palavras e por tão rasgado elogio.

Beijo.