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domingo, 9 de novembro de 2014

Foi num dia de piquenique...



- Estou?
- Sim. Queres saír, arejar, tomar um café, conversarmos, não dizermos nada?
- Estou às voltas com um trabalho que me está a fazer caír o cabelo... não posso saír!
- Ao Domingo?! Tu sabes que dia é hoje?
- Domingo, acabaste de dizer, e eu acabei de dizer que estou presa a um trabalho forçado!
- Não.
- Não?
- Hoje é dia de piquenique.
- A hora de almoço já se foi... isso tem cheiro de adivinha...
- Não é charada, não é adivinhação. Põe água ao lume, eu faço o mesmo deste lado da linha e sobretudo não me desligues o telefone!
- E o meu trabalho? Tem dó de mim...
- Anda lá, chove a potes, tu que gostas de chuva não me pões a andar na rua, eu só te quero ouvir, nada mais!
- Está bem, conta lá. Uma vez que seja, és tu que me contas histórias.
- E o café?
- Quase pronto!
- Então aqui vamos:
 
É dia quente, sol a condizer com o céu azul, ninguém quer ficar em casa, seja para almoçar, seja para passear, todos vão para a rua, o ar apetece, é macio e doce. As famílias pegam numa cesta e carregam pão, presunto e compota bastante que dê para as crianças se entreterem depois da correria e não reclamarem que têm fome. Ao final da tarde regressa-se e cansados, hão-de conversar sobre o belo dia que tiveram, quem encontraram, provavelmente planos que fizeram já para o próximo Domingo. Pelo menos até o tempo permitir e se mantiver assim tão agradável.
 
- Palavra que gostava de te ver a cara agora... Onde é que queres chegar?
- Aí.
- Onde?
- Exactamente onde disseste. Veres a minha cara.
- Cada vez percebo menos...
- Ouve. Ouve com atenção. Afinal é só isso que podes fazer.
 
Só que no regresso a casa encontram o caminho fechado. A cidade onde moram tinha sido dividida em duas e quem a tinha atravessado umas horas antes, de sorriso aberto para fora dos seus limites não voltou a conseguir fazer o percurso de volta: Militares tinham erguido uma vedação em arame formando uma cercania à cidade para defender os seus habitantes de perigos tão grandes, tão grandes que ninguém os vía. As casas ficaram por lá e os que voltavam de cestas vazias do piquenique ficaram do lado de cá.
 
- Como nós...
- Como Berlim.
- Como Berlim há 25 anos atrás.

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