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domingo, 20 de maio de 2012

Jardim interior



Esperou pelo silêncio, pela escuridão dos interruptores, pela cumplicidade dos botões de rosa fechados à lua de quarto minguante.
Nem sequer era um jardim, não havía espaço, meia dúzia de vasos rachados pelos anos de uso a suportarem hortelã, salsa e coentros, algumas flores de cheiro, um canto reservado a um tanque que já não era e aguentava uma espécie de árvore que se discutía entre um limoeiro ou uma lima pois frutos maduros nunca havía dado e o chão pela falta de tempo, passara do sonho da calçada portuguesa ao duro do cimento, agora vaiado de rachas. Era um quintal, um quintal sem terra, um bocado atrás, um escondido que não se quer mostrar, mas onde ela gostava de estar ao sol nos finais de tarde de Verão ou rente à porta da cozinha a ver a água a caír sem se molhar.

Nessa noite não chovía nem o sol a molhava por dentro. Só as lágrimas lhe escaldavam as rugas da cara, escavando mais fundo os sulcos do coração mastigado. Sem ruído. Sem expressão. Sem suspiros.

Trabalhara durante todo o dia e regressada a casa, preparara o jantar. Comeram. Saíram. Entraram. Deitaram-se.
Ela ficara.
Não havía sido diferente dos demais.
Mas na noite anterior, tinha tido o sonho de que a estranha árvore plantada no tanque, brotara rosas perfeitas em botões fechados como punhos. E por uma qualquer razão que não conseguía explicar, achava que tudo o que havía sonhado se havería de concretizar e toda a sua vida se transformaría e que por cada refeição terminada nunca mais havería de ficar só.
Aguardou que o encantamento acontecesse.
Espreitou por várias vezes o quintal e esperou ver nele o jardim. E a noite profunda desembrulhou-se e o cimento gelou e tudo permaneceu como sempre conhecera.

2 comentários:

o Reverso disse...

se este posto corresse o mundo, quantas mulheres gritariam"sou eu, esta sou eu!"

o Reverso disse...

e quantos homens "isto é cá em casa, esta é a porra da nossa vida..."