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quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Repetir



As repetições matam-me devagar, murcham-me e levam-me a dar como resposta um encolher de ombros, deixo de me importar, nem sequer faz sentido não gostar.
Nos últimos tempos dei comigo aprisionada numa armadilha rotineira, sem prazer nem desgosto, um aceno de cabeça e o levantar rápido dos ombros, qualquer coisa, nada de conversa.
Hoje ao ver o Rio e a força que o Sol fazia para romper de qualquer forma a cortina densa e baça do inicio do dia cinza, apercebi-me da voz de Madame e do seu inseparável ponteiro a marcar compasso na obrigação das repetições até à exaustão do mais que perfeito. Ensaiava-se a queda, elegante como uma flor derrubada pelo vento, os braços juntos alongados e prolongando o comprimento do sofrimento ou o encantamento de um sono que sería desperto por um príncipe.
Quanta nódoa negra, joelhos sem pele, cotovelos queimados.
Quem diría que tantas lágrimas, ranho e vergonha me haveriam de servir muito, muito tempo depois, para ensinar outros, outras quedas, em artes contemporâneas e tão menos encantadas em que as flores são arrancadas ou pisadas ao invés de se dobrarem em vénias perante sopros de vento... E ainda assim - as repetições.
Caír tanta vez até parecer que é fácil, natural, que nada custa nem dói que bastou uma só naquele instante. 
Quando o Sol furou um buraquinho e um raio de luz incendiou a cidade percebi que não estava presa, apenas preciso de dançar.
 
 

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