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quarta-feira, 10 de julho de 2013

Surpreendentemente





Esta noite não tem sossego.
Escorrem-me em compassos ritmados uma chuva fina e teimosa que me leva a espreitar o minuto passado e no entanto, não há cansaço, não há frio neste Inverno que me lembre Julho e onde me levará a memória impressa como as dedadas de um aperto de mão franco ou os abraços de um amigo, que repetidamente dizemos o nome tão alto para que ninguém o esqueça?
Esta noite aparenta um dia.
Aquele dia em que na véspera nada dormi, um desassossego no corpo, uma inquietude na alma, mil recados dados e eu verde, como todos somos quando nos apaixonamos e distraídos pelo laço, caímos pelos pés sem termos cuidado onde os pusemos. Mas não é esse o fascinio? O absurdo do descontrole, a tremideira das borboletas apesar de o pré-aviso?
Esta noite estou de amores, viajo a galope disparado com o cheiro do medo a bater-me na cara, pois sei que tudo o que me enche neste quarto já me tocou na vida, já lhe dei o fim, já lhe escrevi as falas, já lhe senti o doce, já engoli o fel, já disfarcei o sal das lágrimas e nem mesmo neste papel antecipado, tola que sou, escolho outro, escolho outra história, outra noite, peço outro dia imitado de noite, que os anseios que me dão abrem-me a porta a vidas de outros que não quero aqui.
Esta noite é igual à de ontem.
Ontem não foi igual a nenhuma e por isso todos as noites são noites de dias em que acho que sei o fim das noites. Mas não é verdade. São palavras que escolho como pequenos Invernos que refresco nos meus pesadelos, ou águas com que dessedento a minha montaria e arrefeço o Estio. Eu verde, sempre crua do que me chega, ávida das palavras que me arribam sem chamamento do seu nome.

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