Encostou a porta de mansinho. Não a quería acordar, sabía como o sono dela era leve e que ao mínimo ruído os olhos se tornariam despertos como o meio-dia pronto e já agora deixava-a, ele ía-se com o gosto do tabaco enrolado a salivar-se nos dedos nervosos e o gesto da colher às voltas entre palavras apressadas na sacudidela do jornal disputado entre a malta chupando goles de café muito quente e ela, pobre que aproveitasse, muito quieta, tão parada como nunca a vira que até pensou - benze-se - que uma coisa má a tivesse fulminado e de viúvo a sua condição passasse a constar, mas não, a veia do pescoço aos pulinhos aliviou-o dos medos e no bico dos pés, apressadinho, sumiu-se.
Mal o trinco da porta a sossegou abriu os olhos. De mansinho deu uma mão à outra e apertou os dedos no enlace de quem se tem a si na solidão de com quem se pode contar. Suspirou. Não profundamente, mas na sensação de que de um aperto se tinha folgado e os pulmões livres no espaço, tragavam ar quanto queríam. A cama toda sua. Encostou o rosto ao lençol e comprimiu o nariz sentindo o cheiro. Depois levou as mãos ainda enlaçadas ao sitio do coração e tentou escutar que ele batesse mais forte. Mais lento. Sentiu sono. Só sono, apenas uma vontade enorme de se enroscar nos lençóis e dormir sem ninguém a despertar.
Ele entrou a chamar por ela. Ela não respondeu. Ele abriu a porta do quarto e deparou com um montinho sob a roupa de cama. Fechou a porta devagar para não a acordar. Mas toda a tarde passou e ela sem dar sinal, coisa invulgar em mulher que dorme pouco e ele ralado, guarda os silêncios, vai de bradar o nome entrando de rompante e abanando o leito. Nada a não ser uma almofada coberta por um lençol e dela nem o cheiro.
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