Já anoiteceu, como me enfada este tempo de espera em que o Rio se atravessa no reflexo dos rostos espalmados no vidro a separarem-se na segurança do apito de abre-portas até se despencarem correria abaixo até ao cacilheiro. Fazem de conta que não vêem a água, miram-se bonitos aproveitando a luz das lâmpadas fluorescentes a comporem cabelos ou a dar puxões a bandas de casaco que escondem as bebedeiras do dia às costas, como me aborrece este cais de espera em que o Tejo nos vê melhor que ninguém, despidos, rindo da nossa condição mortal de estômago faminto e ansioso do pé molhado, que se escape este, ainda assim a barca nos há-de levar ajeitados até ao pedaço de terra que se chama a minha terra, aquela que me há-de comer. O Rio do lado de lá do vidro às escuras. Acham.
in Travessias do Rio, Dezembro 2015
in Travessias do Rio, Dezembro 2015
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