Não sei porquê. Mas esperei ficar sozinha para abrir a gaveta, tirar a pasta castanha, soltar os elásticos e pegar nas folhas. De novo. Com rapidez, não fosse entrar alguém e ver-me a ler, um flagrante que não pretendía explicar, tanto mais porque nem sequer tinha que dar explicações, casa minha, escritos meus, mas aí é que a coisa fica difícil e mentir é que não sei, não é meu, alguém abusivamente imitou a minha caligrafia e pôs-se no meu corpo, coisas de dentro como roupa intima que só o próprio mexe e usa e mesmo sem dizer nada já se sabe que não é para mais ninguém andar a bisbilhotar. Uma, duas páginas, os olhos a apetecerem devorarem todas as letras mas também com vontade de se demorarem para entender pormenores, aonde é que eu andei neste tempo e quem fui que não me recordo, como se fosse mulher num corpo que não se apercebeu que não teve tempo de crescer à vista do mundo e incapaz no volume, rompeu-se, vazou-se, morreu-se.
Não me encontro em página alguma na minha morte. Guardo as folhas à pressa, ouço passos, fecho a gaveta.
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