Escuro, nem sei quantas batem no relógio dos cem anos mas podem bem ser cem horas ou hora nenhuma pois o silêncio é a hora maior que cobre tudo e nem um fio de luz se adivinha por entre as cortinas que arejam o cheiro de terra húmida e desperta o olfacto do cão curioso sentado à janela a fitar o que não vejo.
Boceja entediado, o aparo da minha caneta escuta o som das palavras desenhadas e o ritmo das linhas enchidas adormece-o fazendo deslizar enrolado junto aos meus pés traçados e frios no nu do sobrado, sinto-lhe o pelo quente e ausento-me na respiração compassada que acompanho, rosna baixo, um ponto grosso de tinta mancha letras várias que não consigo lembrar e ainda escuro lá fora, tão azul-china quanto aqui sob os meus olhos.
Pouso o dedo para enxugar excessos e da polpa para a folha e desta para a pele, transfusões de sangue ou tatuagens, escrevo, mas o que faço é desenhar no borrão que resta e em tudo semelhante a uma frondosa copa de árvore, um tronco.
Deito-me.
Sob a árvore.
O cão a meu lado vigia.
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