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segunda-feira, 9 de julho de 2012

Túlia




Espia-me, compõe os óculos e observa-me naquele ar de quem me sabe de cor, por dentro, incomodam-me as suas pequenas tosses, o seu copo de água a acompanhar o eterno livro forrado a papel muito branco, os gestos medidos e imperturbáveis, a pontualidade, a falta de rugas na roupa.
Ouço falar dela como uma figura rara e longínqua, acometida de uma doença invulgar alvo de estudo e de percentagens extremadas, de familia com raízes nobiliárias, mas nada se confirma, é tudo um halo de histórias que se emanam porque nada se sabe e nada se lhe pergunta.
Na verdade não sei porque não se lhe pergunta, porque quando afasto da minha testa todas as teias que não vejo, só encontro simplicidade no trato. Deve ser por isso.
Irritam-me as suas poucas palavras tão acertadas como se tivessem sido um alimento muito bem mastigado antes de ser engolido para não caír mal a um aparelho digestivo delicado.
E depois há a poesia. Aquela sua outra metade que me desconcerta no seu ar tão clean e onde verte os sentires, onde nunca se podería adivinhar que afinal há uma mulher, há pele, há doer, há vontades, uma saudade imensa no adeus.
Há também o amigo, o homem que todos lhe sabem e ninguém aponta a ausência a seu lado. Vivem-se, respiram-se, fazem-se escrita um do outro retalho a retalho, um todo secreto, constroem-se vida.
Às vezes creio que me condena pelas minhas confissões públicas, pelo meu lado dramático e exacerbado do coração e da exposição do verbo como expiação da tormenta. Mas não diz nada, toma um gole de água e fixa os olhos escuros por detrás das lentes no meu rosto, na mesma aparência controlada com que desfia as páginas do seu livro não identificado.
Ela lá e eu aqui.


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