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terça-feira, 6 de novembro de 2007

A Tempestade - Parte Um


Naquele dia o mundo parecía ir acabar-se em água.
O trânsito estava completamente caótico o que subsequentemente provocava a ira dos condutores, a raiva dos pedestres e a impaciência dos utilizadores dos transportes públicos.
A capital assemelhava-se mais a um parque automóvel, estático, apenas recolhendo a chuva que caía em catadupas e se transformava literalmente em mares.
Com o caír da tarde aquilo que parecía mau tornou-se péssimo: as luzes dos carros incendiavam uma visão diluviana em que o único som que se ouvía nitidamente era o das buzinas frenéticas, apertadas, batidas, castigadas nas mãos dos condutores.
Os peões corríam assustados como fantasmas negros e encharcados quando o conseguíam, pois a maioria das vezes arrastavam as pernas por poças cujo fundo era impossível adivinhar.
Parecía que uma cidade inteira se movimentava em direcção a casa sem saber bem onde esse sitio seguro ficava.
Ele tinha perdido o norte: acabou mal abrigado numa cabine telefónica sem luz que parecía ter surgido do mar como um periscópio que espreita as águas inimigas. Olhava ao seu redor apercebendo-se somente de manchas escuras, sem contorno definido, por isso quando a porta da velha cabine se abriu de rompante, o sobressalto fê-lo impulsionar e colar-se às paredes de vidro. E a mulher que entrou assustou-se tanto como ele, pois o grito que emitiu parecía um alerta para uma tragédia eminente. Ela tentou voltar a abrir a porta deslizante mas o nervosismo que a tomou toldou-lhe a precisão dos movimentos e quanto mais exercía força na pega mais a porta se vedava.
Ele tomou-lhe os ombros na esperança de a acalmar mas de novo um grito lancinante como um filme de terror.
Aos poucos ele foi-lhe dizendo, primeiro aos gritos depois gradualmente baixando o tom de voz, que nada tinha que recear, que fugíam os dois do mesmo, que a chuva é que os tinha posto naquela situação, não havía razão para ter medo.
Ela pareceu sossegar um pouco, esboçou um sorriso mal desenhado à defesa e apresentou vários argumentos válidos perante tanta violência no mundo. Ele concordou e foram fazendo conversa de circunstância sempre ao redor do temporal que lhes caía em cima.
Calaram-se e ficaram a ouvir a água violenta a martelar o metal da cabine telefónica.
Ela murmurou que provavelmente nunca saíriam dali mas o ruído era tanto que ele não entendeu. O pânico apossou-se dela e quando o estrondo bombástico do trovão eclodiu ela gritou. Ele abraçou-a e histericamente ela repetía que iríam ficar ali para todo o sempre, que ninguém os iría salvar, morreríam arrastados dentro da cabine como um barco à deriva.
Ele puxou-a mais para si e afagou-lhe os cabelos molhados, dizendo ao ouvido que tivesse calma, que ele estava ali e tomaría conta dela, que nada de mal acontecería, era só água e inundação, trovoada e barulho.

(continua)

14 comentários:

Raquel Branco (Putty Cat) disse...

"Era uma vez uma árvore que se lembrava de ter sido flor."

Wellcome back!!!!!!!!! :)

Maria Clarinda disse...

E aqui estou esperando ávidamente a continuação deste teu texto maravilhoso!


Mando-te um beijo daqueles que roçam com a brisa do ar , mas que sabemos de quem são...
Jinhos mil

Phantom of the Opera disse...

Gosto de ti e das palavras que guardas.
Estava aqui a pensar será que a gas já esqueceu o Lu@r.

Hum...
:)

Beijo bem grande

SONY disse...

Depois da tempestade costuma vir a bonança...vou aguardar pelo desenlace ;-)
Beijo
Fica com Jesus
Até amanhã
Sony formiguinha

poetaeusou . . . disse...

*
mais, mais, mais,
*
xi
*

ASPÁSIA disse...

(D)ESCREVES E "VI O FILME"... ATÉ VI A CARA DE TERROR DA MULHER QUNDO ENCAROU COM O HOMEM NA CABINE...O TEXTO RETRATA CADA PORMENOR...
TB ME RECORDEI DE UM VELHO FILME DE TERROR QUE DEU NA TV HÁ SECULOS, AO Q PENSO UM ORIGINAL ESPANHOL, "A CABINE" EM Q UM HOMEM FICAVA PRESO NUMA, E SEM NINGUEM NUNCA O RETIRAR, A CABINA ERA LEVADA POR UM CAMIAO COM UMA GRUA ATÉ UM ENORME DEPOSITO ONDE JAZIAM DEZENAS DE CABINES JÁ COM CADAVERES E ESQUELETOS DENTRO! NA ALTURA FIQUEI HORRORIZADA...
MAS DECERTO QUE O TEU TEXTO NÃO VAI TER TAL FIM DE TERROR.

BEIJINHO GRANDE :)

Gasolina disse...

Putty,

Nice to have you here.
Thank you for all.
From the heart.

Kisses

Gasolina disse...

Maria Clarinda,

Vais ter que voltar para saber o resto... à sombra da minha Árvore.

Beijo

Gasolina disse...

Lu@r,

Precisava de ti para me "prateares" o céu.
Esquecer?
De modo nenhum! Vê o meu perfil: "uns dias elefante"

Estou feliz de aqui estares e me teres guardado.

Um beijo enorme.

Gasolina disse...

Formiguinha,

Nada mais certo!
Assim como o teu regresso, que aguardo.

Um beijo!

Gasolina disse...

PoetaTuÉs,

Amanhã, amanhã, amanhã!

BEI/de MARÉ

Gasolina disse...

ASPÁSIA,

CREIO QUE TB VI ESSE FILME ATÉ PORQUE SOU FÃ DE FILMES DE TERROR.

MAS ESTE "FILME" DAQUI NÃO TEM NADA DISSO E O RESTO É SÓ ESPERAR PARA SABER...

ABRAÇO GRANDE, GRANDE!

£ou¢o Ðe £Î§ßoa disse...

(vou continuar, tu "obrigas-me" mesmo sem o saber...)

Gasolina disse...

Louco de Lis,

Obrigo nada!
Tu é que queres, não é assim?