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sexta-feira, 25 de março de 2016

Não ouço


 
 
Não há gaivota nem chão nem muro de cimento, quatro paredes civilizadas atiram-se a pino como abas de caixote pronto a ser fechado, a abertura é o céu que deixa caír para este pátio água ou vento ou restos de adivinhação de sons de vida para lá deste branco pintado.
Não ouço nada a não ser a cascata construída a preceito, medidas de rigor que arrastam uma torrente de vinte canais que despencam para uma taça que apara e bebe e volta a deixar caír numa cansativa barulheira que abafa tudo, não ouço nada e nem a mim, repito-me para me escutar mas uma surdez grita-me a plenos pulmões e até o cigarro me amarga a vontade.
Olho o céu no quadrado geométrico que a liberdade da vista ao alto me permite, sufoco-me nesta caixa de pensamentos que se calcam e os pés inquietos vão e vêm sem conseguir numerar passos ou ordenar frases ao ritmo da queda da água superiormente principal no cenário onde conto tanto quanto o vaso de flores esquecidas de regar.
Nem sei porquê, apresso-me.
Uma pausa que acaba por me oprimir, talvez do céu ou da água ou da falta da gaivota ou dos que ainda não chegaram aqui para comigo conversarem inalados no vício, todavia nem sei o que lhes dizer se não me ouço, repito, não os ouço.

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