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terça-feira, 17 de março de 2015

Portas & Janelas - Esboço nº 16


 
As fotografias é para isto que servem.
Para nos apercebermos da ferrugem do tempo, dos vidros quebrados, da nossa imagem ida na pedrada atirada que mesmo com boa mira já se foi e até no cálculo da velocidade vá lá saber-se quem poderá estar do outro lado e ser-se atingido. A nossa imagem colada a quem atingiu. Para todo o sempre. Deve ser por isso, que os casais que vivem juntos muitos anos acabam por se aparentar como se fossem do mesmo sangue, uma pedrada que acabou por os ferir da mesma forma, a ferrugem do tempo a entrar-lhes no corpo e a colorir-lhes as marcas das feridas aos poucos, lentamente, acabando por parecer quase uma tinta, uma pele.
Como esta porta da fotografia.
Que embora não a tenha conhecido nova e de pintura brilhante, vidros intactos e transparentes, sei-a como se a visse aberta, franqueada a bom negócio, moldura robusta e de encosto perfeito a algum meliante que de quando em vez vinha espiar o proprietário meio adormecido. Devem tê-la fotografado, honrados, pomposos da sua cor e da escolha do sitio.
Mas é tão majestosa olhá-la assim, quase decadente, silenciosa e frágil, com os segredos profundamente enraizados como se alguém a segurasse apenas com uma corrente e um cadeado. Como os casais juntos por muitos anos.
 
 
(in Portas & Janelas, Maio-2014)

Todas as fotografias da Colecção Portas & Janelas são da autoria de Eduardo Jorge Silva

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