
Ao levantar a tampa o que salta à vista são as cores, os lilazes a sorrirem entre os pálidos envergonhados do açúcar amarelecido dos recadinhos dos pedaços de papel rasgado à sorte para deixar memória do não te esqueças de mim, lembra-te, eu também, para sempre, para sempre numa caixa de sapatos entre botões caídos nos abraços da despedida e o perfume do lenço molhado que secou no agitar de tanto se dizer ao horizonte adeus, que não te vejo mais, onde estás que te quero e não consigo recordar, ainda agora nos meus braços sentía calor e depois vazio, frio, peso de malas que se arrastam em mudanças de vida mas a caixa de sapatos essa vai comigo para todo o lado, carrego-a como a minha vida, tem mechas de cabelo minha e da minha mãe e até da minha avó e dos meus filhos, tanta gente que aqui cabe entre flores que secaram e se desmancham e nem deste modo lhes perdemos o destino de apontarmos e contar que nesse dia foi oferecida para pôr na lapela, tal como vai na fotografia, esta, e mais esta, todas as que aqui estão a preto e branco de cantos retorcidos de tanto passarem entre dedos e bocas de beijos e esta medalhinha, quase esquecida! E um brinco, o outro perdido, sabe-se lá por onde, oferecidos por um namorado muito querido, segredos, quantos, tantos, ah se esta caixa falasse...
- A caixa é para levar?
- É sim.
Leva a caixa dos sapatos novos que comprou.
Um dia há-de ter cores bastantes na sua vida que os sapatos não lhe farão falta alguma.
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