Todos os textos são originais e propriedade exclusiva do autor, Gasolina (C.G.) in Árvore das Palavras. Não são permitidas cópias ou transcrições no todo ou/e em partes do seu conteúdo ou outras menções sem expressa autorização do proprietário.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

O autocarro

Alça a perna e apoia o pé no degrau, corredor ao fundo, do lado direito o mais junto à água e ao nascer do sol, lugar só de pessoa que se quer só nas manhãs que ainda são noites, nada de conversa, nada de pontos de interrogação, de distracções urbanas pela miséria de outros mal disfarçada nas invejas mastigadas como pão com manteiga, vai mal para baixo e tudo o que quer é subir.
Até o amarelado lhe queimar os olhos permite-se a rigidez da postura pela imponência dos fragmentos que lhe cravam fotografias disparadas na rapidez dos momentos.
Depois, depois já não há depois, há o diluír da figura sentada, a moleza do astro no peito, derrete-se em falas dispersas, acode nas respostas, quem és tu, ah tu, fecha os olhos e ela fecha obediente, sente no cachaço a mão que ampara a coluna do pescoço, afago nos caracóis, a cabeça perdida na tontura das linhas que se arrumam e diz, diz tudo de uma vezada como um poema aprendido à força de lágrimas por tanto gostar e achar que é seu o que o poeta fez, isso faz-se, e os solavancos da travagem freiam-lhe os cavalos dos indios que são os que sempre pensa em imagens e letras e bolhas como esta aproveita para as soprar na direcção dos dedos que a alcançam e lhe tocam na boca, abre a boca e ela abre, tiram-lhe letras encravadas na goela e dão-lhe água a beber, em fio, chove quando sai do autocarro.

18 comentários:

Teresa Durães disse...

um imenso maranhar de vidas dentro de vidas

pin gente disse...

apertaste-me mais o peito.... que já anda apertadinho.

deixo um beijo
luísa

CNS disse...

Dessas viagens impregnadas de gente só. A memória da luz amarela...

Belíssimo, querida Gasolina!

um beijo

Abssinto disse...

Texto frio mas contemplativo, como a chuva.

bj

Ema Pires disse...

Nao sei o que passou, mas parece que o meu comentário desapareceu.
Era para te dizer querida amiga de fogo, que estive a ler os teus magníficos textos.
Vejo que tens uma data de prémios com lindas imágens.
Um grande abraço com a minha amizade.

Gasolina disse...

Teresa,

Muitas, tantas.
As reais e dimensionadas, as inventadas e trazidas até à dimensão do hoje.

Gasolina disse...

Pin,

Recordações?


Beijo grande L.

Gasolina disse...

CNS,

Mescla de sonhos e realidade. Onde termina um para iniciar-se o outro(?)

Abraço apertado em ti C.

Gasolina disse...

Abssinto,

Frio... foi o que sentiste?

Achei que o amarelo do sol a despontar amornasse...

Beijo para ti

Gasolina disse...

Ema,

Que bom ver-te na Árvore!

Prémios são a tua presença e as tuas palavras, muito obrigado.

Beijo de saudades Amiga de Fogo.

Carla disse...

gente...em companhia dos seus sentires pensados
como gostei!
beijos

Arábica disse...

Essa escrita que nos leva de encontro à vida do lado de dentro...

Gasolina disse...

Carla,

Isso mesmo!

É uma solidão...muito acompanhada.

Um beijo para ti

Gasolina disse...

Arabica,

Deixas-me vaidosa. Muito. Bastante.

Obrigado.

Beijo

Laura Ferreira disse...

.......................
isto foi a ganhar fôlego, depois de as tuas palavras me terem tirado o ar de todos os bocadinhos do meu ser.
Sim, sol, amarelo, chá, conversas, uma mão? só5? eu gostava que fosse uma mão mais uma. e passavam a ser 6.
Nina, riso, palavras que parecem cavalos a galopar, desvairados.
cores, um palco com projectores de recorte e silêncio a recortar a sombra, o peito a subir e a descer.
e uns pés a voar no linóleo, sem os tocar, a dançar com as palavras.
música? sim, ouvi-a ontem.
Obrigada, querida Gasolina, tu que me fazes arrepiar com o que escreves.

Gasolina disse...

Laura,

Há coincidências?
Ou é o Universo a ajustar o que anda solto?
E de onde vieram a música, as revelações, as gargalhadas, o atropelo das palavras na velocidade do sangue a correr para o coração da boca?

Há coisas que não se explicam. Basta haver, basta existirem.

Um abraço de tirar o ar.

ASPÁSIA disse...

PODIA SER A DESCRIÇÃO DA MANHÃ DE MUITOS, MAS AQUI HÁ A DIFERENÇA DE SE IR NO AUTOCARRO A DEITAR A ALMA PELAS PALAVRAS ESCRITAS NO CADERNO...
EM TEMPOS EU TOMAVA O AUTOCARRO EM SENTIDO INVERSO, N-S. MAS ESCREVER NEM SERIA POSS+IVEL... ERA O AUTOCARRO DA EMPRESA E PASSAVA-SE A VIAGEM A TAGARELAS COM OS COLEGAS - EM PARTICULAR UM ESPECIAL, POR QUEM EU FAZIA MALABARISMOS PARA FICAR AO LADO DELE... MAS NEM SEMPRE ERA POSSIVEL!
RECORDAÇÕES MUITO MUITO LÁ PARA TRÁS...

BOAS VIAGENS, GAS!

Gasolina disse...

ASPÁSIA,

EU FUJO DOS TAGARELAS!
ENTÃO PELA MANHÃ, NEM PENSAR!

POIS É, O AUTOCARRO É UM NINHO DE OBSERVAÇÕES. PASTO PARA MUITO DO QUE ESCREVO.

BEIJOS, JARDINEIRA!

(LÁ VOU EU PARA MAIS UMA VIAGEM!)